Aprendi em mais de 30 anos de jornalismo a lição básica: “jornalismo tem lado, mas não pode brigar com os fatos”
Por Chico Araújo – DF
Com a data máxima venia, atrevo-me a rabiscar breve colóquio 9não aqueles flácidos para acalentar bovinos0 sobre a pusilanimidade no ofício de informar. Irei direito ao ponto desse arrazoado: a reflexão acerca do jornalismo exercido hodiernamente no Acre.
Não é intenção ferir susceptibilidades. Como dito, é uma ponderação da abordagem dispensada sobre temas sensíveis envolvendo próceres da política (ou não) locais.
Aprendi em mais de 30 anos de jornalismo a lição básica: “jornalismo tem lado, mas não pode brigar com os fatos”. Aqui, entendo, que “o lado” é o da honestidade intelectual, da exposição correta dos fatos.
Na última quarta-feira (15) a Corte Especial do STJ (Superior Tribunal de Justiça) tornou réu o governador do Acre, Gladson Cameli (PP), por suposto esquema de corrução, renovou [por mais um ano] as medidas cautelares, decretou a indisponibilidade, e decidiu, por ora 9informou a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi0, não o afastar do cargo. Decisão unânime.
Esse é o fato.
Curioso (é dever do ofício), passei a compulsar a imprensa do Acre (onde atualmente não há mais nenhum jornal impresso) sobre o decisum do STJ. Clique aqui, ali, acolá… Resumo da ópera: em praticamente todos os sites, o mesmo tom: “sem fatos novos”, “STJ decide não afastar Gladson do cargo de governador”…
O não afastamento de Gladson é apenas parte do veredito do tribunal.
Dizer não haver “fatos novos” é menoscabar a inteligência alheia.
O STJ tornou réu o governador, que será julgado pelos seguintes crimes: organização criminosa, corrupção nas modalidades ativa e passiva, peculato, fraude à licitação e lavagem de dinheiro (no terno correto, branqueamento de capitais). Ademais, a Corte Especial do STJ renovou as medidas cautelares e decretou a indisponibilidade dos bens dos acusados (agora, réus).
Pois bem!
Fiquei a matutar. Devo ter clicado em sites do planeta B612 (do clássico da literatura, no qual o personagem central vive sozinho, apenas com três vulcões, algumas baobás e uma rosa, e viaja por seis planetas diferentes para, enfim, chegar à Terra e entender o sentido das coisas), e não em URLs da imprensa acreana.
Eram devaneios. Não conectei portais do planeta B612. Acedi, sim, a sites da imprensa do Acre.
Granjeado do sentido da quimera, a massa cinzenta me conduziu ao garboso tempo dos periódicos Diário do Acre, Repiquete, O Varadouro, Folha do Acre, Gazeta do Acre, O Rio Branco, Página 20, e das rádios Difusora e Andira. Quanta falta eles nos faz em dias atuais.
Era mais um devaneio.
Cai na real. Aqueles periódicos (de jornalismo informativo, corajoso e investigativo) são coisas do passado, estão todos no obituário da “terra do já teve”.
Para amainar a reminiscência do impetuoso “jornalismo que o Acre já teve”, e na falta de um “quebe”, de uma “salteñas” ou do inesquecível “tacacá da Base” para libar nesse clima seco do Cerrado, onde vivo por quase três décadas, fiquei pensar o pensamento pensado do (meu amigo) jornalista Ricardo Kotscho, in verbis:
“Parece que as novas gerações não querem escrever reportagens, e sim editoriais. E a reportagem é o que há de mais importante”.
Ex positis, concluo, “jaz no Acre o jornalismo” garboso de outrora.
(Chico Araújo foi repórter de diversos jornais, dentre os quais O Estado de São Paulo e hoje é advogado militante no Distrito Federal)