Big Techs, bolhas e o derretimento dos empregos

Big tech tecnologia Misto Brasília
A tecnologia está relacionada à criação de empregos e também ao desemprego/Arquivo

A transformação digital é uma tendência irreversível, ou melhor uma estrada obrigatória para todos

Texto de Charles Machado

O desemprego acelerado em muitas empresas de tecnologia nos últimos meses vem provocando muitos questionamentos, afinal é o fim do boom tecnológico? Onde estarão os novos empregos se não no setor de tecnologia?



Com juros sendo elevados, o mercado começa a sentir a dificuldade na captação do dinheiro fácil, afinal se antes as startups poderiam contar com fundos de investimentos, investidores anjos, a elevação do juro e a possibilidade uma segurança maior no investimento de títulos públicos, fez com que os investimentos de riscos fossem ligeiramente alocados, ou seja, a mistura de inflação alta com taxa de juros elevados faz com que o mercado fuja do risco de investimentos sem a certeza do resultado, o que atinge em cheio as startups, ao mesmo tempo se a pandemia acelerou a transformação digital de muitos setores a forceps, com a volta das pessoas ao seu local de trabalho muitas o desenho muda novamente para mudanças um pouco menos aceleradas.

É o fim do boom tecnológico, ou apenas uma parada? Bem, a transformação digital é uma tendência irreversível, ou melhor uma estrada obrigatória para todos, que vão nela caminhar com maior ou menor eficiência, e nessa tentativa muitos negócios vão ficar pelo caminho, seja por terem entrado tarde, seja por não terem escolhidos os melhores quadros para comandar suas mudanças ou simplesmente pelo fato de que o seu negócio definhou sem futuro algum.

Se em muitas já identificamos uma avalanche de demissões, em outras como Meta e Uber, as contratações diminuíram, as vagas de emprego do Twitter e da Coinbase foram rescindidas, e assim demissões em massa se espalharam pelo setor. Essa combinação de fim do dinheiro fácil somada a uma redução na velocidade da transformação digital acaba criando esse cenário que eu prefiro chamar de freio de arrumação, a adequação entre expectativa e realidade.



De acordo com dados do site de recrutamento Indeed.com, as vagas de emprego para desenvolvedores de software nos EUA aumentaram 120% acima do valor de referência do início de 2020, antes da pandemia. ZipRecruiter, outro site de anúncios de emprego, concluiu que o número de vagas no setor de tecnologia é alto, oferecendo aproximadamente 1,6 empregos para cada pessoa desempregada do setor.

Entre as que mais estão demitindo funcionários estão as empresas de tecnologia que se beneficiaram do aumento da demanda por seus produtos e serviços relacionados à pandemia. Robinhood, Peloton, Netflix e Cameo anunciaram demissões. Meta, Uber, Snap, Instacart e Lyft já disseram que vão atrasar as contratações.

Mas com quase 17.000 trabalhadores demitidos em maio, de acordo com sua contagem baseada em relatórios de mídia e declarações de trabalhadores, alguns executivos parecem compartilhar o “sentimento ruim” sobre a economia anunciada pelo CEO da Tesla, Elon Musk, este mês.

Agora que grupos de venture capital alertaram que no próximo ano será difícil, a contratação por empresas privadas é focada na sustentabilidade. E a Combinator, a incubadora de startups mais conhecida por ter abraçado o Airbnb em seus primeiros dias, alertaram os fundadores em uma carta que “teremos que nos preparar para o pior”. O crescimento a todo custo parece ter diminuído, mas isso indica o fim de uma bolha? Os valores em bolsa dessas empresas de tecnologia indicavam que estávamos diante de uma bolha?



O fato é que por algumas décadas as Grandes Empresas de Tecnologia se beneficiaram de um longo período de falta de regulação, em parte por causa da tradição americana de forte desregulamentação desde a administração Reagan, e em parte porque, simplesmente, ninguém sabia como regular tal fenômeno e crescimento. Como resultado, experimentamos o crescimento de impérios empresariais autênticos que, de fato, foram colocados entre as empresas mais valiosas do mundo, em muitos casos em premissas completamente sem sentido, mas que, na época, pareciam razoáveis para nós, basta recuperar os valores de empresas como Yahoo entre outros sites que apenas entregavam o acesso, sem nenhum outro produto ou serviço.

É como se estivessem vendendo a praia, e nós esquecemos que o mundo poderia ofertar inúmeras outras praias nesse disputado mercado da atenção, com o tempo o valor passou a ser onde nós despejamos o nosso tempo e dessa forma na migração da economia da atenção as empresas forma perdendo seu valor na proporção da queda de sua audiência.

Ainda dando atenção aos aspectos regulatórios, e o fim do período do “tudo é possível” , primeiro a Europa, e depois os Estados Unidos e por decorrência a China e a mão pesada do Estado, vem abraçando a necessidade de regular a grande tecnologia, em parte para evitar que se tornem enormes monopólios poderosos e acabam provando muitos escritores de distopia de ficção científica direito, e em parte tentando gerar ambientes que melhor protejam os cidadãos contra uma voracidade brutal que transformou as pessoas apenas em dados, e esses limites surgem pra lembrar que não somos números, mas pessoas que precisam ter sua privacidade e suas individualidades e escolhas protegidas.



Em alguns casos, como o Facebook (agora Meta), a crise vem de uma saturação do mercado combinada com um cansaço do modelo. Em outros, como a Netflix, ela vem como resultado de sinais que parecem indicar uma saturação que não necessariamente ocorreu ou como forma de lembrar a empresa que ela precisa continuar a manter seu caráter disruptivo em relação aos novos entrantes no negócio de streaming, mas estamos falando de algumas das maiores quedas da história do mercado, o que não é dizer pouco.

Teremos uma nova crise como a de 2000? Muito pouco provável, pois aquelas empresas eram frágeis com modelos de negócios incipientes e muito pouco comprovados, agora são grandes impérios empresariais com muitas reservas de dinheiro e a capacidade de se reinventar, dentro dos limites regulatórios, o que não necessariamente pode implicar em oportunidade para novos grupos, pois ao meu ver o desenho atual tem muito pouco espaços para novos atores, fora do bloco EUA e China.


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