Um grito pela vida no trânsito de Brasília e do Brasil

Ciclistas Distrito Federal
Movimento pela humanização do trânsito sugere menos carros nas ruas e mais transporte público e alternativo/Arquivo/Roda da Paz

A morte da pesquisadora e cicloativista Marina Kohler Harkot, 28 anos, em um acidente de trânsito na zona oeste de São Paulo na madrugada de domingo (08) evidencia, mais uma vez, a necessidade de transformar as vias das grandes cidades brasileiras em espaços mais seguros para todos. É essa a opinião de especialistas consultados pela DW Brasil, para os quais pedalar no país ainda é um ato de bravura.

No Distrito Federal, somente neste ano foram mortos 12 ciclistas. As duas últimas vítimas foram um ciclista atropelado na BR-251, em São Sebastião, na noite passada. Ele ainda não foi identificado. Outro, foi atropelado no domingo na DF-205, na Fercal. O motorista chamou ajuda, mas quando a política apareceu, Renato Ferreira fugiu e foi se apresentar mais tarde na delegacia de polícia.

O total de vítimas no trânsito do DF nestes dez meses chega a 1380 pessoas, incluindo ciclistas, pedestres, motociclistas, passageiros e os próprios motoristas de automóveis, segundo a Roda da Paz.

O total de vítimas no trânsito do DF nestes dez meses chega a 1380 pessoas, incluindo ciclistas, pedestres, motociclistas, passageiros e os próprios motoristas de automóveis, segundo a Roda da Paz. A entidade e mais 32 organizações lançaram na semana passada um “Manifesto pela vida no trânsito”. O documento afirma que “é hora do GDF (Governo do Distrito Federal) e dos órgãos responsáveis se posicionarem de forma mais contundente para evitarem essas mortes e tornar o trânsito mais humano e seguro para toda a sociedade brasiliense.

“Pedalar é uma questão de coragem porque o ciclista enfrenta não só o trânsito, mas todo um sistema que diz que ele é inapropriado para aquele espaço”, afirma Yuri Vasquez, pesquisador e ativista da Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade), que Marina Harkot também integrava.

Para Vasquez, as colisões letais no trânsito brasileiro de modo geral podem ser comparadas aos homicídios, porque ambos os tipos de morte violenta podem ter mais ou menos chances de acontecerem de acordo com variáveis de gênero, classe e cor de pele.

Essa sobreposição de fatores também é apontada pela diretora-presidente da União de Ciclistas do Brasil (UCB), Ana Luiza Carboni, de Niterói (RJ). Ela acredita que Marina não foi apenas vítima de uma colisão com um automóvel cujo motorista não parou para prestar socorro.

“As minhas escolhas de pedalar à noite são baseadas mais na segurança pública – onde eu vou me sentir mais segura – do que na segurança da via”, diz. Carboni pondera que, se ruas e avenidas com ciclovias e ciclofaixas não apresentassem possíveis riscos para mulheres de madrugada, talvez Marina pudesse ter pedalado por um caminho em que ela estivesse menos exposta a colisões, ainda que se calcule que o motorista, nesse caso, tenha ultrapassado a velocidade máxima permitida.

“Hoje, em média, 80% do espaço viário nas grandes cidades é pensado para esses veículos, que são usados por menos de 30% da população”, acrescenta Carboni. “Usar transporte público ou andar a pé ou de bicicleta ainda não é visto como algo positivo. Eu tenho que ter um automóvel para ser bem-sucedido, para ter conforto. Mas as nossas cidades se desenvolveram, as regiões metropolitanas cresceram, e não se evou para esses lugares todos os serviços.” Na opinião da especialista, permitir que as pessoas possam circular com segurança, inclusive de bicicleta, possibilitaria que mais pessoas pudessem acessar serviços públicos, como escolas e hospitais, de modo mais ágil.

Vasquez avalia que, apesar da pressão de cicloativistas, poucas mudanças ocorreram no Brasil ao longo da última década. “A sociedade civil tem trabalhado nisso, e nós temos trabalhado na difusão da cultura da bicicleta como um todo, só que sozinhos não conseguimos. Nós precisamos que todos os estudos de mobilidade urbana que estamos fazendo ao longo dos anos saiam do papel e se tornem políticas públicas, tanto de municípios quanto no âmbito federal”, diz o pesquisador.

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