Crise vai criar novas oportunidades no setor de bares e restaurantes

Rodrigo Freire Abrasel
Rodrigo Freire diz que quando houver a retomada da economia não vai ser fácil para ninguém/Arquivo/Divulgação

O Misto Brasília começa hoje (02) uma série de entrevistas com representantes dos setores produtivos acerca do impacto da crise provocada pela pandemia do novo coronavírus. As entrevistas tem por finalidade ajudar a compreender a situação econômica que vivemos.

A primeira entrevista aborda a problemática do setor de bares e restaurantes, provavelmente o mais impactado pelas necessárias medidas de isolamento.

O brasiliense Rodrigo Freire, diretor Associação Brasileira de Bares e Restaurante (Abrasel) e sócio do restaurante Oliver, apresenta diagnóstico sobre o impacto do Covid-19 no setor. Segundo Freire, a retomada econômica da área que mais emprega no DF será um desafio para empresários “heróis”.

O setor de bares e restaurantes sofre ainda com as ações do GDF para combater o Covid-19. Qual é a atual situação financeira desses negócios?

O setor de bares e restaurantes foi um dos que mais sofreu no mundo com essa paralisia e no DF não foi diferente. O setor, especialmente, apresenta grande vulnerabilidade porque tem a folha de pagamento e a estrutura de custo dependentes do faturamento do dia a dia. Veja, uma paralisação de 15 dias já pode comprometer todo o futuro de uma operação. E a cada dia que passa, diminui a capacidade de sobreviver dessas empresas.

De certo modo, alguns empresários estão melhores posicionados, porque tiveram a inteligência de estancar todo tipo de custo fixo. Outros haviam se preparado anteriormente ou antecipadamente para o delivery ou take out. Esses negócios estão conseguindo sobreviver melhor. Outros muitos não estão.

Mas de modo geral, o pequeno empresário e o pequeno empreendedor, que trabalham com a família, têm sofrido muito para manter faturamento. Dos 12 mil empreendimentos de alimentação fora do lar no DF, 70% são de pequenos negócios e que dependem de fluxo de caixa, entre R$ 5 mil e R$ 10 mil mensais, para sua sobrevivência.

Em relação ao mercado, o setor de bares e restaurantes movimenta outros 80 segmentos diferentes desde bebidas, carnes, frutos do mar e avicultura. A suspensão dos bares e restaurantes causou um efeito em cascata com o sofrimento em conjunto.

O isolamento social e as regras e as condições de redução da jornada e do salário (MP nº 936/20) geraram qual impacto nas atividades econômicas do setor?

Acredito que em um cenário de hoje, e sendo otimista, que 25% dos negócios do setor de bares e restaurantes vão morrer e não devem reabrir. Mas em um cenário mais realista o número deve chegar a 40% ou 50%.

Portanto, o que pode acontecer é que muitas empresas podem ser repassadas para terceiros, ou seja, podem ser vendidas para novos sócios. Vão surgir novas oportunidades e temos sentido isso e identificamos essa possibilidade também em pesquisas.

Importante também, muitos restaurantes que são muito mais experiências de gastronomia, que trabalham com público consumidor mais esclarecido, responsável e com idade mais elevadas vão sofrer mais.

Por outro lado, os bares para gente mais jovens devem retomar mais rápido. Acreditamos que essas pessoas estão loucas para sair de casa e ter alguma coisa para fazer. Isso se dá já que a cidade não vai ter, tão cedo, os grandes eventos de músicas e espetáculos. De certa forma, isso vai ajudar muito os pontos de bares a terem uma retomada mais forte.

Provavelmente, com esse fechamento de empresas, quem conseguir sobreviver bem a tudo isso vai encontrar um cenário de mercado mais positivo. Por mais que isso seja muito triste, é importante ver pelo ponto de vista da economia já que hoje a gente estima que o Brasil perdeu mais de um milhão de empregos. E em Brasília são mais ou menos 20 mil pessoas que perderam sua posição de trabalho com o fechamento do setor.

Já tem o levantamento econômico dos prejuízos com fechamentos de bares e restaurante devido as ações impostas para combater o Covid-19?

A pergunta agora é se a gente vai conseguir estender o programa emergencial do governo brasileiro por mais dois ou três meses. Isso deve ser pensado porque as empresas não vão conseguir honrar a folha de pagamento nos próximos meses sem ter faturamento. Esse é o próximo ponto bem crítico que vamos ter que enfrentar.

Acho que o Governo Federal deu uma contribuição muito grande, apesar das pessoas reclamarem. Por exemplo, nos EUA até agora não saiu a ajuda para segurar empregos como saiu aqui no Brasil. Por aqui, foi garantido ao trabalhador brasileiro uma estabilidade e amparo emergencial.

Em relação em desligar o funcionário ou suspender o contrato, o empresário deveria decidir isso antecipadamente. Tem que identificar aquele funcionário, que na retomada, não vai poder contar e manter todos que serão essenciais. Por mais dura que seja, essa é uma decisão empresarial que ele tem que tomar antes.

Sobre a volta do comércio, a Abrasel está fazendo uma cartilha para orientar o empresário de como será o espaçamento entre as mesas porque, com as restrições, os restaurantes podem perder até 50% da ocupação.

Veja, em alguns municípios, a gente está requerendo a ocupação de calçadas ou espaços públicos para poder minimizar a queda do faturamento. Os bares e restaurantes, provavelmente, vão começar de uma forma mais lenta e cuidadosa pensando com responsabilidade como atender o cliente, manter o faturamento, segurar os empregos e, mais importante, seguir as novas regras para evitar contágios.

Será que após essa pandemia do Covid-19 as experiências gastronômicas dos restaurantes e bares de alto padrão vão mudar?

Certamente, as experiências gastronômicas vão mudar muito e houve uma aceleração de mudanças que já haviam acontecendo. As operações com autoatendimento, os negócios voltados para congelados e todo tipo novo e inovador de negócios vão surgir para atender a demanda que está se reconfigurando. Por outro lado, algumas tendências como os restaurantes de experiências, que tinham um viés de crescimento antes da pandemia, vão sofrer intensamente.

Além matar pessoas e impactar no setor que mais emprega no DF, o Covid-19 tem outro lado triste que é praticamente acabar com sonhos de muitos empreendedores que são verdadeiros heróis em um país que é muito difícil de empreender. Além do sofrimento das pessoas que perderam seus familiares, a gente vai ver uma geração de possíveis empresários desolados e com medo de partir para a luta, abrir seus negócios e gerar empregos. Aqui no Brasil, o empresário sofre tanto, ou até mais, quanto o desempregado porque ele deve sair do cenário desses (pós-isolamento) com o nome sujo e, muitas vezes, com dificuldade de conseguir crédito e até emprego.

A gente tem que fazer um trabalho de não acabar com a esperança do empreendedor, do cidadão e de pessoas que querem colocar a cara em um negócio, empreender e fazer a economia girar.

Como os bares e restaurantes estão se preparando para a volta da atividade econômica após o isolamento social?

A retomada tem toda uma discussão. O mercado está um pouco dividido e que não valeria abrir agora no momento que a imprensa e a opinião pública ainda estão com a visão do “Fica em casa”, no uso máscara e não saia de casa.

E por isso, o movimento nos restaurantes seria pequeno e o prejuízo seria maior. Nós, como entidade, da Abrasel estamos cobrando transparência dos governos para entender o real cenário. Precisamos ver os números de ocupação de leitos em hospitais e pensarmos em fazer um trabalho bem planejado para uma retomada da economia em um formato responsável.

Infelizmente, quando houver a retomada da economia não vai ser fácil para ninguém. Mas é muito importante a volta das atividades para os consumidores irem adquirindo confiança no consumo. É importante que as lideranças de setor briguem por essa retomada.

A gente também vai ter um novo momento que será um aprendizado para os governos. Será uma realidade dura para os governantes com uma queda absurda de receitas com impostos e que, provavelmente, vai causar o desequilíbrio fiscal gigantesco. O próximo ano vai ser desafiador para os governos inclusive para honrar a folha de pagamento dos funcionários públicos e os compromissos com fornecedores.

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