Fake news, a história

Estão confundindo fake news com internet, quando na verdade esta última é apenas o instrumento que permitiu viralizar a falsa notícia, que começou com a civilização, sob a forma de intriga, maledicência e outras modalidades da mentira, feita não apenas por prazer, mas para obter um determinado resultado. 

A fake news já teve inclusive um doutrinador e teórico que deu à mesma consequências monstruosas, qual seja o Ministro da Propaganda do Reich Alemão, Joseph Goebbels, que cunhou a frase “Uma mentira mil vezes repetida acaba se tornando uma verdade.” 

Igualmente monstruosa a assertiva do chefe da SS Nazista, Heinrich Himmler, que sustentava tender a mente humana a aceitar como verdade o que é mais próximo de um acontecimento proporcional a outros já verificados, do que admitir algo de proporções gigantescas e inomináveis. 

Referindo-se ao Holocausto, acrescentou a monstruosidade de dizer que escapariam da responsabilidade brutal que lhes cabia, com o raciocínio pervertido de que 70 mortes são uma tragédia, 10 milhões são uma estatística. 

A par dessa teratologia, pode-se calcular o mal que a Fake News, sob a forma de intriga, causou ao longo dos séculos quando sussurrada ao ouvido de monarcas muitas vezes paranoicos e também homicidas. 

Fácil imaginar o efeito de uma simples dúvida causada a Josef Stalin por alguém que desejasse o fim de um desafeto. 

Saddam Hussein era sujeito à fake news visual. Em reuniões de Ministério ninguém olhava na direção dele, que tinha a obsessão de interpretar olhares, com o que a fake news poderia vir do olhar daquele que se tornava ao mesmo tempo autor e vítima da notícia falsa de deslealdade. 

Além desses exemplos dramáticos, que marcam a fake news como algo da excrecência da raça humana, tem ela sido usada também para fins políticos e eleitorais. 

No Brasil o caso mais notório é o da campanha presidencial de 1945, praticamente ganha pelo Brigadeiro Eduardo Gomes, derrotado ao final pela fake news de que o candidato dispensava o voto dos marmiteiros, dos operários que apoiavam Dutra, candidato de Getúlio Vargas. Valeu-se Hugo Borghi, autor da infâmia, do fato de que a palavra “malta” usada pelo Brigadeiro referindo-se aos maus elementos que apoiavam Getúlio tinha também o sentido de abranger os operários que carregavam marmitas. 

Jânio Quadros, um notável psicólogo intuitivo, preveniu a fake news contra ele na véspera da eleição presidencial de 1960, advertindo pela televisão: “Fiquem atentos. Vão dizer que eu renunciei à candidatura. Vão dizer que eu não sou brasileiro.” 

E quando todos rimos em nossos lares, ele, como se nos visse, completou: “E não riam não! Vão dizer que eu morri!” 

Ganhou. 

Mas a fake news é de tal forma peculiar que basta reforçar um aspecto de notícia ainda que verdadeira, para que essa ênfase produza um mal desejado ou não. 

Quando Carlos Luz, no exercício da Presidência da República, exonerou o poderoso Ministro do Exército General Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, resolveu no último momento, em um gesto de cortesia, ligar para o Ministro, para despedir-se dele. 

O ajudante presidencial ligou e disse que o Presidente desejava falar com o General Lott. 

O ajudante de Lott, que atendeu o telefonema, respondeu:

 O Presidente quer falar com o ministro Lott?

 Sim, quer falar com o general Lott. 

O ajudante de ordens disse a seu chefe:

 Perguntei se o presidente queria falar com o ministro Lott, mas o auxiliar disse que o presidente queria falar com o general Lott. 

Lott determinou ao seu ajudante:

 Diga que o ministro Lott está muito ocupado para atender o presidente da República. 

Ficou o ministro no seu cargo e o presidente, horas depois, já deposto, cruzava a Baía da Guanabara rumo ao exílio, a bordo do cruzador Tamandaré, com Carlos Lacerda e outros, sob o fogo dos canhões do Forte Copacabana, com o artilheiro dando apenas tiros de advertência enquanto ao telefone Lott exigia:

 Atire para afundar! Para afundar! 

É possível ainda que a fake news possa ao mesmo tempo ser favorável a uns e prejudicial a outros. 

Na lenda que cerca a figura do campeão militar espanhol, Cid, o Campeador, relata-se que depois de morto foi amarrado à sela de seu cavalo para que seus soldados, julgando-o vivo, se entusiasmassem na carga de cavalaria, com o que ao mesmo tempo se abatia o ânimo do adversário. 

Contemporaneamente existe também a fake news oficial. 

Por exemplo, quando o Banco Central do Brasil anuncia a taxa Selic o faz de maneira a que o público creia que é uma taxa para o tomador final, enquanto os bancos continuam fazendo o que bem entendem, impunes porque não há contra eles controle da Agência Reguladora, o BC. 

Assim, o problema real não está só na Internet, que é apenas o meio de fulminante disseminação da falsidade. 

A questão está na natureza humana e não há como regular a mentira nem as incontáveis formas pelas quais ela se espalha. 

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