O trabalho da perícia nos crimes ambientais

Perito criminal DF PCDF
Perito criminal durante curso de campo sobre incêndio florestal no Parque Nacional de Brasília/Arquivo/André Borges/Agência Brasília

O trabalho do perito criminal é verificar e analisar os vestígios relacionados a esses crimes

Por Giancarlo Chelotti – DF

Muitas pessoas acreditam que os crimes ambientais estão relacionados apenas às questões relacionadas ao desmatamento e queimadas, mais presentes na mídia. Porém, o dia a dia da perícia criminal ambiental é muito diversificado, resultando em atendimentos de uma série de tipos de crime: contra a flora, contra a fauna, de poluição, de problemas com o licenciamento ambiental e até contra a administração pública.

Desmatamento, incêndios florestais, caça e pesca ilegal, parcelamento irregular do solo, maus tratos de animais e poluição hídrica, do ar, do solo e até sonora são os principais exemplos de crimes contra o meio ambiente.



O trabalho do perito criminal é verificar e analisar os vestígios relacionados a esses crimes para materializá-los em evidências do acontecimento do fato delituoso. Mas o grande desafio é fazer com que o cliente do Laudo (delegado, juiz, promotor, advogado) enxergue a cena e enquadre ela em um crime ambiental previsto na Lei.

São realizados tanto exames internos, como caracterização e eficiência de instrumentos de crimes ambientais (motosserras, apetrechos de pesca, maquinário pesado, equipamentos de emissão sonora), quanto externos (desmatamento, parcelamento irregular do solo, esbulho possessório). Além de locais que há interface entre as perícias externas e internas, como casos de poluição, onde são coletadas amostras para análise em laboratório.



Existem algumas grandes diferenças entre as perícias mais conhecidas, como as de crimes contra a pessoa ou contra o patrimônio, e a perícia ambiental:

1 – A extensão do local: normalmente são locais com grandes extensões, na ordem de hectares, fazendo com que o perito percorra grandes áreas e se utilize de ferramentas tecnológicas como drones e imagens de satélite para poder visualizar todo o local.

2 – Ausência e impossibilidade de isolamento de local, em razão da extensão, podendo haver, inclusive, situações flagranciais ocorrendo durante o exame pericial.

3 – Requisições periciais recorrentes para o mesmo local, uma vez que muitos crimes ambientais se perpetuam no tempo e se tornam crimes continuados.

4 – Requisições periciais abertas, sem objeto pericial bem delimitado. Em muitos casos é o perito que acaba dizendo, no laudo, qual o crime ambiental que ocorreu (se ocorreu) no local.

4 – Local de crime, normalmente, é na “casa” do autor e não da vítima. Fazendo com que o perito esteja sempre em risco.

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5 – Necessidade de o perito abordar a legislação ambiental, pois a Lei de Crimes Ambientais prevê crimes chamados de “normas penais em branco”, onde cabe ao perito enquadrar as situações fáticas verificadas no local aos conceitos da legislação.

6 – Obrigatoriedade de valoração dos danos ambientais, sendo essa a principal ferramenta de punição estatal. Como as penas restritivas de liberdade são muito brandas para os crimes ambientais, a única forma de se punir devidamente o criminoso ambiental é por meio da sua descapitalização. Uma vez que o Judiciário tende a acatar as valorações propostas, os laudos periciais se tornam fundamentais para possibilitar um julgamento assertivo e definir a devida punição.

7 –  A vítima de crimes ambientais não é uma pessoa e sim a coletividade. A poluição de um rio, por exemplo, pode afetar o abastecimento de água de um bairro ou cidade, por exemplo.

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Quando se trata de crimes contra a fauna, ainda existe uma forte cultura de posse de animais silvestres. O tráfico de animais é o terceiro maior mercado ilícito do mundo, atrás apenas do tráfico de drogas e de pessoas. A retirada desses animais dos seus habitats intensifica o processo de extinção. Perícia em animais é a única forma de materializar esse crime. O traficante de animal encara essa atividade como uma profissão comum. Se ele não for retirado de circulação, vai continuar traficando. E sem perícia as chances de haver condenação são muito pequenas.

Os laudos periciais podem ser vistos como retratos da situação ambiental. Ao demonstrar a intensidade, tamanho e até impacto financeiro de um dano ambiental, a perícia se torna grande fonte de informação não só para o processo penal, mas para a sociedade, podendo ser, inclusive, instrumento de educação ambiental. Nesse sentido, a perícia criminal ambiental vem contribuindo para preservação da biodiversidade e do direito da sociedade ao meio ambiente.

(Giancarlo Chelotti é perito criminal)

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